
Na praça recém-reformada, com aparelhos de ginástica reluzindo ao sol e bancos estrategicamente sombreados por árvores centenárias, acontece o espetáculo mais moderno do Brasil urbano: o mercado aberto da ilusão embalado em pinos plásticos coloridos. Das 7h às 22h e vira a noite, com pontualidade que faria inveja a qualquer repartição pública, os jovens empresários do tráfico movimentam seu estoque como se estivessem na Bolsa de Valores.
O cenário mudou. Antes, diziam que o tráfico dominava vielas escuras e áreas abandonadas. Hoje, a praça é deles, e a luz do dia não incomoda mais. É como se a própria impunidade tivesse fornecido uma autorização informal de funcionamento. Não há medo. Não há vergonha. Há rotatividade.
A Polícia? Ah, essa ainda tenta. Corre, prende, leva, faz boletim, apresenta ao juiz. Mas no dia seguinte, novos estagiários do crime já ocupam a vaga do colega promovido à cadeia. A fila anda com uma eficiência que o SUS invejaria.
E quando um policial ousa jogar ao vento algumas carteiras de trabalho, símbolo da dignidade e do esforço, a reação é hilária (ou trágica, depende do seu humor): os jovens fogem em pânico. Como se aquele papel azul representasse uma ameaça à liberdade, não a do ir e vir, mas a de viver à margem, sem regras, sem chefe, sem despertador.
Vivemos a era em que a vadiagem ganhou status de estilo de vida. Trabalhar virou coisa de trouxa. Ser preso virou troféu. E quando a casa cai, são todos vítimas: da sociedade, da exclusão, da falta de afeto, do capitalismo, do algoritmo ou da ausência de wi-fi público.
Mas não se preocupem. O Estado vai resolver com mais praças, mais luzes e, quem sabe, um Wi-Fi gratuito chamado “Sonho Perdido”.
Carlos José Batista
COMENTÁRIOS